sexta-feira, 27 de março de 2015

Covilhã - Frei Heitor Pinto II

    O nosso blogue vive do espólio de Luiz Fernando Carvalho Dias, que continuamos a explorar e divulgar. Sempre soubemos o interesse do investigador por Frei Heitor Pinto, que deu origem em 1952 à publicação de "Fr. Heitor Pinto (Novas Achegas para a sua Biografia)", a 1ª da sua vasta obra. 
  Aquando das comemorações do IV centenário da morte do frade jerónimo, que se realizaram na Covilhã a 2 de Dezembro de 1984, empenhou-se totalmente para que a figura de Frei Heitor fosse mais divulgada.


   Começámos a publicar informações sobre Frei Heitor Pinto. Baseamo-nos em reflexões de Luiz Fernando Carvalho Dias, em fotografias e textos da Exposição de 1984 e na sua obra sobre Frei Heitor Pinto. A apresentação da pintura a óleo de Frei Heitor Pinto, bem como a inauguração da Exposição Bibliográfico-Documental, realizaram-se no átrio da Câmara Municipal no dia 2 de Dezembro de 1984 e antecederam uma Sessão Solene comemorativa do IV Centenário da Morte de Frei Heitor Pinto.

 Vejamos algumas imagens da sessão solene:




  




Nota dos editores - As fotografias são de Fernando Duarte, Covilhã.

As publicações do blogue:

Estatística baseada na lista dos sentenciados na Inquisição publicada neste blogue:
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2011/11/covilha-lista-dos-sentenciados-na.html

As publicações sobre Frei Heitor Pinto no nosso blogue:
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2015/02/covilha-frei-heitor-pinto-i.html

sábado, 21 de março de 2015

Covilhã - Os Forais XXI

    Continuamos a publicar documentos do século XIX relacionados com a reforma dos Forais. Luiz Fernando Carvalho Dias deixou-nos vários estudos e algumas reflexões sobre o assunto.

 […] “A carta régia que em 1810 abriu caminho aos estudos da Reforma dos Forais começou a ser executada em 1812 e da Comissão faziam parte João António Salter, que presidia, Trigoso e mais dois canonistas, um dos quais João Pedro Ribeiro.
Informa Trigoso que a carta régia de inspiração de D. Rodrigo de Sousa Coutinho “não tinha outro fim mais que paliar a funesta impressão que haviam de fazer” os tratados com a Inglaterra, tão prejudiciais à nossa indústria, que o mesmo Ministro assinara então. Destinava-se ainda a procurar o meio de “fixar os dízimos, minorar ou alterar o sistema das jugadas, quartos e terços, fazer resgatáveis os foros e minorar ou suprimir os foraes” […]

     O liberalismo é um momento importante no sentido desta mudança, pois, como dizia Melo Freire substituir os forais era tão urgente como o Código Político. No entanto as opiniões divergiam, embora haja passos importantes que não podem ser esquecidos:
- Já do Rio de Janeiro, numa Carta Régia de 1810 dirigida ao clero, nobreza e povo fora ordenado aos governadores do Reino que tratassem dos meios “com que poderão minorar-se ou suprimir-se os forais, que são em algumas partes do Reino de um peso intolerável”.
- Em 1811, a Mesa do Desembargo do Paço expede ordens para que os corregedores das comarcas averiguem esse peso dos forais.
Em 17 de Outubro de 1812 a Regência cria a Comissão para Exame dos Forais e Melhoramentos da Agricultura.
- Em 1815, D. João volta a querer que se investigue sobre “os inconvenientes que da antiga legislação dos forais provinham ao bem e aumento da agricultura”.
- É já nas Cortes Constituintes, em 1822, que é promulgada a chamada “redução dos forais”.
- A contra-revolução miguelista, em 1824, revoga as anteriores medidas.
- Marco essencial é a reforma de Mouzinho da Silveira (1832) em que desaparecem os foros, censos, rações e toda a qualidade de prestações sobre bens nacionais ou provenientes da coroa, impostos por foral ou contrato enfitêutico. Na verdade o governo de D. Pedro pretendia fazer uma revolução da agricultura e social que atingisse a nobreza, o clero, os municípios, os desembargadores, os donatários, tomando medidas como: extinção dos morgadios e vínculos que não ultrapassassem os 200000 réis de rendimento líquido anual; supressão das sisas sobre transacções; extinção dos dízimos; nacionalização dos bens da Coroa e sua venda em hasta pública.
- A reforma continua pelo século XIX.

Memória sobre as Sesmarias
[...]
Terceiro Periodo

D, João II
         


A pesar disso, o mesmo sistema continuou nos tempos seguintes e com o mesmo infeliz êxito. Tinhão-se passado 26 anos depois de se ter concluído o codigo do Snr. D. Afonso V quando este soberano convocou as Cortes de Coimbra e Evora, celebradas nos anos de 1472 e 1473: aí representaram os povos muitas cousas tocantes às Sesmarias as quais se contem desde o cap. 67 ao cap. 78 dos místicos; todas elas tiveram uma só resposta na qual aquele principe prometeu fazer uma nova Lei sobre esta materia: e que a dita Lei fosse feita e publicada consta claramente do cap. 109 das Cortes do Snr. D. João 2º, principiadas em Evora a 12 de Novembro de 1481, e acabadas em Viana d’apar d’Alvito em Abril de 1482, no qual capitulo se manda guardar a mencionada Lei; mas até agora não se tem podido descobrir onde ela exista ou que a determinasse.
            Contudo combinando-se as mencionadas representações dos Povos que derão motivo à Lei com o titulo das sesmarias que veem nas Ordenações Manuelina e Filipina pode-se deduzir com bastante fundamento que os §§ destas Ordenações que não foram tiradas do Regimento do Snr. D. Duarte, tiveram por fonte a Lei do Snr. D. Afonso 5º e tais são na Filipina os §§ 1.2.3.4.9.10.11.12.14.15.16.
            Assim é de supor que as disposições das Ordenações Manuelinas e Filipina, que não tiveram por fonte as Leis referidas, são a do § 1º em quanto declara que ao Soberano somente pertence dar aos sesmeiros (riscado = pois que os povos no Cap. 67 das mencionadas Cortes do Snr. D. Afonso V pediram que esses sesmeiros fossem feitos pelos concelhos e só confirmados pelos soberanos; e é provável que a Lei deferisse a esta suplica porque no tempo do Snr. Rei D. João 2º se faz menção de sesmeiros postos pelas camaras) e a do § 13 que para maior favor da lavoura manda que as Sesmarias de terras izentas se deem izentas; e as terras tributarias se deem com o tributo das terras.

D. Manuel

           Vê-se, pois, que o Snr. Rei D. Manuel ajuntando num só titulo que é o 67 do Liv. 4 das suas ordenações a legislação que em diversos tempos havião feito os seus antecessores e acrescentando alguns artigos que nela faltavão fez por assim dizer uma nova lei das sesmarias que desde então ficou em vigor e foi depois transcrita com poucas alterações na Ordenação Filipina Tit. 43 do Liv. 4. E contudo no § 1º deste titulo 43 que se acha uma alteração mui notavel a qual ou fosse feita de proposito ou por descuido dos compiladores veio a diminuir em grande parte o bom ou mau efeito que se podia seguir desta Lei: consiste ela em permitir que se não deem de sesmaria as herdades quando os seus donos alegarem e provarem causas legitimas para se não deverem de dar; quando a Orden. Manuelina, ainda no caso de serem alegadas e provadas essas causas, manda que as ditas herdades ou sejão aproveitadas pelos donos ou dadas de sesmaria. 
                                 
D. João III

            (Riscado: E contudo a Ordenação Filipina tem dois artigos que se omitem na Manuelina; o primeiro é o que vem no fim do § 15 o qual foi tirado duma lei do Snr. D. João 3º que é a 8ª. do Tit. 2 Part. 2 da Coll. de Leis Extravagantes e o segundo é o que determina no meio do § 1º sobre a audiencia que os sesmeiros devem dar aos donos das herdades onde se lê: e se taes cousas allegarem e provarem porque as não devão dar, não se darão: e se as não allegarem ou provarem assinem-lhes hum anno para que as lavrem” etc onde é de notar que na Ordenação Manuelina omitindo-se as palavras não se darão e formando das antecedentes e seguintes um só periodo não quiz que se admitisse caso algum que obstasse a dar as terras de sesmaria: assim as palavras acrescentadas na Ordenação posterior ou fossem postas muito de proposito ou por descuido dos compiladores vieram a diminuir em grande parte o bom ou mau efeito que se podia seguir da Lei das Sesmarias.)
            Reflectindo-se pois nas alterações que teve esta Lei desde as Cortes do Snr. D. afonso V até à Ordenação Filipina convem observar (riscado: 1º Que nesta epoca se deu uma grande consideração aos sesmeiros, fazendo-se de nomeação Regia, quando dantes eram postos pelas camaras e por isso sujeitos às mesmas camaras; e o caso é que ainda depois de serem nomeados pelo soberano tinham a mesma dependencia dos concelhos não só para efeito de não poderem dar de sesmaria os maninhos sem consentimento do dito concelho mas para admitirem o recurso aos juizes ordinarios quando se suscitasse controversia sobre a justiça das sesmarias dadas. Deste modo a jurisdição destes Magistrados não correspondia de modo algum à prerrogativa da sua nomeação, e os juizes ordinarios com os oficiaes das camaras podiam mais facilmente fazer o oficio de sesmeiros e escusar um maior numero de pessoas ocupadas na mesma cousa. e neste periodo a pesar da Ordenação Manuelina e posteriormente a ela, ainda se complicarão mais estes oficios creando-se juizes dos maninhos distintos dos sesmeiros; o que deu causa às justas queixas dos povos ao Snr. Rei D. João 3º nas Cortes de Torres Novas de 1525 e de Evora de 1535, cap. 45 às quaes aquele soberano promete satisfazer).
           Que estando até esse tempo sugeitas à Lei das Sesmarias só aquelas terras e herdades que se achassem desaproveitadas tendo sido dantes lavradas e cultivadas; ficaram desde o Snr. D. Afonso V sujeitas à mesma lei todos os terrenos incultos, maninhos, baldios, charnecas, etc e daqui veem as novas disposições que regulam o que pertence propriamente à concessão destes bens.
            Que pertencendo por via de regra estes maninhos aos povoadores das terras e a sua administração aos concelhos parece que a Legislação do Snr. D. Manuel se foi favoravel à Agricultura foi muito danosa aos mesmos concelhos, emquanto mandou que as sesmarias se dessem izentas e sem novo foro, não só nas terras que já fossem aproveitadas mas tambem nos maninhos; clausula esta que se deve subentender ainda que não venha explicita no § 13 da Ord. Filipina. Na verdade assim como não era necessario que as Camaras recebessem foros ou pensões dos terrenos desaproveitados e que passavam para novo possuidor, sendo nesta parte justa a derrogação que fez o Snr. D. Manuel à antiga Lei das Sesmarias, assim tambem seria mais conforme ao Systema desta Legislação (não ao arbitrio já proposto por esta Comissão; e coherente ao que se determinou à cerca dos baldios de contins) que os novos Proprietarios dos terrenos d’antes maninhos pagassem aquela pensão ou foro aos concelhos para ser aplicado às comuns necessidades dos moradores a quem dantes pertenciam os ditos terrenos.
           E tanto isto assim é que as mesmas Ordenações Man. e Filipinas que mandam dar os maninhos pelos sesmeiros sem foro ou pensão, mandam, no Liv. 1 tit. dos Vereadores, que estes aforem em pregão os bens do concelho; de maneira que os terrenos incultos são dados ou livres pela Lei das Sesmarias ou com pensão pelo Regimento dos Vereadores.
           Ainda outra incoerência se descobre na ultima redacção da Lei das Sesmarias; em quanto manda que os senhores das propriedades sejam obrigados a aproveitá-las e semeá-las dentro d’um ano, sem atenção às qualidades das terras e às boas ou más desculpas que eles podiam alegar, concedendo depois para o mesmo fim cinco anos àqueles para quem passassem as ditas terras: no que ficaram de muito pior condição os que tinham a seu favor o precioso direito de propriedade.
            E o caso é que a Lei das Sesmarias, feita e regulada pelos cuidados de tantos soberanos, ainda não teve em toda esta epoca execução, nem a podia ter, atendido o estado publico da Nação e a mesma Legislação Portuguesa.
            Que a Lei das Sesmarias não teve execução é um facto dificil de provar; (riscado. 1º por uma carta do Snr. Rei D. João 2º consta que na Vila de Pinhel e no seu termo havia muitos pardieiros e cortinhas que há grandes tempos e anos não são e não forão aproveitados; e tambem terras que em outro tempo haviam sido vinhas, as quais havia 20, 30, e 40 anos e mais que não foram aproveitadas, pelo que eram os montes e matos em elas tão grandes que se acolhiam a eles porcos e ursos e outras alimarias. 2º Do principio da Carta de 13 de março de 1772, consta que o Snr. Rei D. João 1º querendo reduzir a cultura e povoação a Serra de Tavira, inculta e ocupada de matos e arbustos silvestres, a concedeu de sesmaria aos Povos adjacentes para que a rompessem e cultivassem e povoassem: que não cumprindo aqueles primeiros donatarios com as sobreditas obrigações que lhes impunha a lei das Sesmarias, mandou devassar a mesma serra a todos os que a quizessem romper e cultivar; que não havendo ainda aquela providencia produzido os seus devidos efeitos até o Reinado do Snr. D. Manuel, veio nele a julgar-se a sobredita serra pertencente à Camara de Tavira; que então a Camara fora concedendo aos lavradores diversos terrenos para cultivarem debaixo de certo foro e pensão. São estes factos, são mesmo estas providencias dos nossos Soberanos constantes (?) à lei das Sesmarias. 3º Sendo desnecessario alegar outros exemplos particulares da pouca execução desta lei) por quanto sendo escusado referir exemplos particulares e que constam de documentos autenticos dos muitos e preciosos terrenos que por todo aquele longo periodo estiveram sem cultura basta em geral reflectir na representação da Camara de Tomar ao Snr. Rei D. Filipe 3º na qual expunha que “O Reino todos os anos padecia fome, que se remediava com o pão que vinha de França e outras partes, a troco do qual levavam deste Reino mais de 500$ cruzados que é um tributo necessario que se não pode escusar. (Elucidario: Palavra Sesmaria) Quem reflectir no baixo preço dos generos neste tempo conhecerá a horrorosa falta de grão que havia em portugal depois de estarem em vigor havia tanto tempo as leis das Sesmarias.

Filipe III

            Mas como poderiam executar estas Leis nas circunstancias que se viu Portugal desde os tempos dos Senhores Reis D. João 2º e D. Manuel. Hé observação feita pelo nosso judicioso Manuel Severim de Faria que tendo-se esmerado os nossos soberanos principalmente até ao Snr. Rei D. Diniz na povoação e cultura das terras; se experimentava no seu tempo uma grande falta de gente assim para a milicia como para a navegação e muito mais para a cultivação da terra, pois por falta de gente Portuguesa se serviam os mais dos Lavradores escravos da Guiné e mulatos; e deste mal já se queixava antigamente com admiravel singelez (sic) Garcia de Rezende n’uns versos da sua Miscellanea.
            He escusado repetir as causas daquela notavel despovoação; pois é bem sabido que as conquistas que os portugueses intentaram desde o tempo do Snr. Infante D. Henrique e sobretudo as da India, cometidas pelo felicissimo Rei o Snr. D. Manuel não só privaram este Reino dos muitos braços que eram necessarios para a cultura das terras e povoação do Reino mas embaraçaram o progresso da mesma cultura e povoação, em quanto só elas abrião um novo caminho para a gloria, para a riqueza e para a ambição dos portugueses; os quais ao principio se haviam contentado com os preciosos frutos da sua cultura e industria, e com isto se achavam honrados e enriquecidos.
            Assim no tempo daqueles soberanos que se apelidavam – Povoadores e Lavradores – Portugal povoou-se e cultivou-se; mas no tempo dos soberanos conquistadores teve o Reino um tão grande aumento de gloria e prosperidade externa como diminuição no estado da sua agricultura: E daqui se seguiu naturalmente não se poderem executar as leis das sesmarias.
            Outro obstáculo grande que teve a execução desta lei em consequencia das conquistas, foi o luxo e as delícias em que começaram a viver os portugueses, e que fizeram esquecer a primitiva simplicidade dos nossos costumes e propagaram o amor do ócio e duma vida mais regalada, do que foi consequencia refluirem para a Corte as pessoas nobres das provincias com suas familias aquem seguia um grande numero de servidores e moços que faziam grande falta aos lavradores para exercicio das suas lavouras; do que já se queixavam os povos ao Snr. Rei D. João 3º nas Cortes de Torres Novas e Evora de 1525 e 1535. Abuso este que foi crescendo pelo tempo adiante e que fez chegar a Cidade de Lisboa à grandeza e luxo que temos visto, em dano muito sensivel da povoação e cultura das provincias.
            Ultimamente o sistema da legislação portugueza impedia a devida execução da Lei das Sesmarias porque eram mais fortes os obstaculos que dela se seguiam à agricultura do que era forte a obrigação posta aos lavradores para aproveitarem as suas herdades. Entre aqueles obstaculos lembram facilmente os seguintes: 1º a opressão dos creadores e donosdos gados em razão das leis que se conteem na Ordenação do Liv. 5 Tit. 115 e que lhes proibiram debaixo de graves penas não só a passagem do gado para Reino estranho mas comprá-lo, vendê-lo e conduzi-lo a pastar fora do termo em que eram moradores sem as solenidades de cartas de vizinhança, licenças da camara, registos, assentos, etc. proibição esta que reconheceu como opressiva dos creadores e povo a mesma Ordenação Filipina no § 19, apesar de renovar a este respeito as leis anteriores dos Snrs. Reis D. Manuel e D. João 3º.
               2º A outra semelhante opressão que resultava aos lavradores da Ordenação do Liv 5 tit. 112 in. pr. e Tit. 76 que não só proibiam a extracção para fora do reino de trigo, farinha, cevada, milho e de outro pão, sem licença d’El Rei mas a compra dos mesmos generos feita para revender. Na verdade, as restrições demasiadas ao comercio interno dos grãos não só impendem em prejuizo publico o giro do mesmo comercio mas promovem a escacez e carestia do genero e pesam de varios modos sobre o Lavrador, o que é hoje corrente entre os publicistas.
            Outro obstaculo causava à lavoura a liberdade ilimitada que tinha um proprietario de despedir o seu Rendeiro ainda quando ele tratasse bem a herdade e lhe fizesse prontos pagamentos; abuso de que já se queixava o nosso Severim de Faria e ao qual atribue a falta de povoação e cultura da Provincia do Alentejo.
            Tambem o uso dos pastos comuns e as restrições particulares que havia da liberdade de tapar os terrenos concorria muito como já em outro lugar se mostrou para a falta dos gados e decadencia da Lavoura.
            Ultimamente o privilegio de certos lavradores ou de seus caseiros e rendeiros em quanto os izentavam de concorrerem com os outros não privilegiados para a satisfação dos tributos e outros encargos publicos, ou lhes concediam certos direitos e liberdades que aos outros eram negados; causavam um dobrado encomodo aos lavradores não privilegiados e prejuizo à agricultura.
            Eis aqui as razões porque a Lei das Sesmarias não esteva nem podia estar em vigor por todo o tempo que decorreu desde as Cortes do Snr. D. Afonso 5º de 1472 e 1473 até ao fim do Reinado dos Reis Catolicos.
(Continua)

(Lisboa 10 de Março de 1813)


Fonte - BNP Reservados

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Publicações anteriores sobre forais:
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2015/02/covilha-os-forais-xx.html
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sábado, 14 de março de 2015

Covilhã - Memoralistas ou Monografistas XV

    Continuamos hoje a publicar os monografistas da Covilhã, começando com algumas reflexões de Luiz Fernando Carvalho Dias já publicadas neste blogue.
        
“Convém enumerar os autores de monografias da Covilhã, os cabouqueiros da história local, aqueles de quem mais ou menos recebi o encargo de continuá-la, render-lhes homenagem pelo que registaram para o futuro, dos altos e baixos da Covilhã, das suas origens, das horas de glória e das lágrimas, dos feitos heróicos e de generosidade e até das misérias dos seus filhos, de tudo aquilo que constitui hoje o escrínio histórico deste organismo vivo que é a cidade, constituído actualmente por todos nós, como ontem foi pelos nossos avós e amanhã será pelos nossos filhos. […]

Esta memória histórica que continuamos a apresentar, já publicada no volume I da “História dos Lanifícios” (Documentos), de Luiz Fernando Carvalho Dias, e designada por Memória das Fábricas da Covilhã, é cópia do original existente no Museu Britânico, que o investigador obteve, obsequiosamente, através dos irmãos William e Anthony Hunter, penteadores de Bradford na década de 50 do século passado, que conheceu em Lisboa, no Congresso da Lã, realizado em 1953.
A Memória, de autor desconhecido, foi citada, sem crítica, por diversos escritores, entre os quais J. Lúcio de Azevedo, mas nunca fora publicada, apesar do seu indiscutível interesse para a história económica, certamente, por a cópia conhecida da Biblioteca Nacional de Lisboa se encontrar deteriorada em longas passagens.
Quando o autor entregou à Federação Nacional dos Industriais de Lanifícios, no ano de 1939, o trabalho de que fora encarregado de elaborar, designado por “Aspectos Sociaisda Indústria dos Lanifícios e Subsídios para uma Monografia Histórica” (Relatório duma inquirição 1937-1938), incluiu alguns fragmentos desta Memória, segundo a versão existente na Bibioteca Nacional de Lisboa. Sobre ela refere: “que dá indicações muito interessantes não só sobre a fabricação dos panos, mas também sobre a psicologia dos industriais, mercadores e operários que a ela se dedicavam, no século XVIII. De certo modo, certos aspectos desta monografia são como que um inquérito industrial à indústria desse tempo e uma base de informação para a grande reforma pombalina.” 
   
MEMÓRIA  DAS FÁBRICAS DA COVILHÃ
[…]

É mimosa de muitas águas em fontes nativas, além das particulares, que servem para o público: o chafariz de Stª Maria; a do pelourinho; a da Lavadeira (sic); a da Dorna; a de S. Lázaro; a de S. João; e a do Lameiro; tem mais em área as fontes seguintes: a Fonte Nova; a da Pipa; a do Raimundo; a das Galinhas; a de Perabade; a da Coarca; todas de cantaria; a da Rua Direita; a do Santão; a Fonte Santa; a de S. Martinho; a da Gramática; a do Caminho Novo; a do Senhor da Ribeira; e a do Tenente Filipe Botelho. Além destas, entram para a villa as águas que descem da Serra para a parte do poente por aquedutos de pedra, as deste sítio das Sete Fontes distante quase um quarto de légua; e entrando no reduto do Castelo junto à torre se principiam a dividir para algumas casas e quintais particulares para onde quotidianamente correm; e depois de cairem nos principais chafarizes, se repartem pelo juiz da água, eleito na câmara, por horas, para quintais situados dentro na mesma terra.
Foi a Covilhã fundada no ano de 700 pelo Conde D. Julião; há tradição que nela viveu o Senhor Rei D. Diniz, que a encheu de privilégios e isenções, e lhe mandou levantar os muros; antes da divisão de Castelo Branco e do Fundão, era o termo desta vila de 600 lugares: são suas armas, uma serra (sic), em campo azul.
Tem nas duas ribeiras próximas de que está circundada na distância de um quarto de légua e menos, quarenta e sete moinhos existentes, de moer pão; a saber: na parte do Norte, chamada da Carpinteira, trinta e nove; e na do Sul oito; e todos têm sessenta e duas pedras a trabalhar. Tem mais outra da parte do Sul chamada Agua Alta e nesta dezoito moinhos cada um com duas pedras; e vem a ter nestas três ribeiras só destes enge­nhos 65 e 108 pedras; em cujo número se não compreendem os que ficaram destruidos na grande trovoada de 8 de Maio de 1750 de que só existem os assentos; nem os que se acham junto à Aldeia do Carvalho, arrabalde desta vila, distante meia légua para a parte do Sul.
Há na mesma vila todos os sábados um chamado rasto que vem a ser, vários chibarros e carneiros, que vem a vender em pé à Praça da mesma; coisa muito prejudicial, tanto ao comum como à Real Fazenda; o qual se deve proibir com penas graves pelas razões abaixo declaradas.
Primeira: as pessoas que vão ao dito rasto, a maior parte são os oficiais do tráfico da lã; e como é no sábado pela manhã cedo, gastam nele até ao meio dia a comprar, e esfolar; e neste tempo bebem várias partidas de vinho, de sorte que muitos ficam incapazes, por bêbados, e de tarde não trabalham; fazem a conta ao que lhes custa a carne, mas não a fazem ao dia que perdem, nem ao vinho que bebem, que fazendo-lhe a conta direita­mente, fica-lhe muito mais cara do que se a comprassem no açougue, que há duas vezes na semana, e haveria todos os dias se neles houvesse quem a comprasse: E como cada um leva seu quarto ou o que lhe parece, no Domingo comem tudo e nos mais dias morrem de fome.
A segunda: como é feito pela manhã cedo o dito rasto, vêm a ele vender muitas rezes furtadas; como sucedeu em 5 do mês de Agosto próximo passado, que furtando-se no dia 4 do mesmo vinte carneiros a um lavrador, no mesmo dia 5 se venderam no dito rasto; e vindo de tarde pessoa da parte do dono, em procura deles, sim achou notícia de se venderem nele; mas como já estavam esquartejados, e cada um com sua porção, não pôde fazer maior averiguação, e ficou-os perdendo.
A terceira: que é prejudicial à Real Fazenda, pela diminuição da sisa, que não pagam, por serem vendidos em pé, nem real da água, de que muito se carece para o conserto dos caminhos e fontes; e pelo contrário no açougue paga estas duas contribuições.
Esta desordem se evita com um aviso que se faça, ao juiz de fora da mesma vila para que proíba o dito rasto; e que no caso de quererem continuar, castigue àsperamente tanto os vendedores, como aos compradores.
Pela abundância das águas e bondade das mesmas, e a antiga curiosi­dade dos primeiros habitadores, deram princípio ao negócio e tráfico dos panos, e baetas, de que resultou constituir-se a fábrica tão bem reputada, que no ano de 1573 o Senhor Rei D. Sebastião mandou fazer na mesma os primeiros padrões, que foram vistos na Cidade de Portalegre, e na Vila de Estremoz, e também se repartiram outros pelas fábricas, que havia por outras partes do Reino; e determinou à câmara da dita Vila da Covilhã o mesmo monarca, por carta sua, escrita no dito ano, que a certidão da entrega. dos mesmos padrões nas ditas fábricas se enviariam, e ficassem no arquivo em boa guarda, para a todo o tempo constar fora esta a primeira e a melhor do reino. A ela foi dado um Regimento que individualmente trata do modo, forma e perfeição com que estes géneros se devem fabricar; o qual no ano de 1690 foi aditado porque havia melhor conhecimento de obrar panos e baetas e fazer tintos duráveis.
Desta fábrica resultou aos habitantes desta vila grande utilidade porque todos se empregaram com desvelo na agência dos panos; pelo que alcançaram muitos privilégios, que concederam os Senhores Reis destes Reinos, a quem se obrigaram em perpétuo a pagar 600$000 rs. de sisa particular em cada um ano, repartida no mês de Maio por todos os fabricantes e trafican­tes que nele obravam alguns destes géneros; a cujo tributo ficaram também obrigados os do lugar do Teixoso, e de outros povos no arrabalde. Devendo porém ir em maior aumento, hoje se acha em total decadência, ou pela miséria dos tempos, e falta de dinheiro, ou pela introdução dos panos estran­geiros, de que começaram a fazer maior gasto os nacionais deste Reino. Esta porém não é a causa formal da sua destruição, mas sim outra oculta, por castigo da Divina Omnipotência, pelos demasiados vícios em que deram os oficiais, apartando-se dos actos que devia(m) formar o juízo para o bem, e utilidade, dando só assenso à refinada malícia; e por ela têm industriosa­mente escogitado o modo de furtar mais honesto e imperceptível e aos que não têm tal ou qual experiência no que convém a alguns ou à maior parte dos fabricantes menos bem morigerados para não perderem um ponto da ambição, cuidando que deste modo tão desonesto haviam de conseguir, em poucos anos muitas riquezas, com os mais que apartados deste abomi­nável sistema, se regulam pelo mais seguro da consciência.
A mesma decadência em que se acha o trato e negócio dos panos e baetas fabricados nesta fábrica, dão claros indícios do que foi antigamente, tanto porque ainda se conservam vestígios permanentes e assentos de ofici­nas, como porque ainda existem a trabalhar 14 pisões na Ribeira da parte do Sul em que se acomodam trabalhando mais de 70 oficiais, cinco oficinas de tingir e em duas destas há quatro dornas somente para tinta azul com pastel, que é de todas a mais segura e perdurável. No mesmo sítio se vêem 4 demolidas, deputadas para o mesmo exercício: trabalham mais dezasseis oficinas, ou tendas, do tosar e prensar, com 42 oficiais; em uma não há este exercício; e 4 se acham demolidas.


A Fábrica Campos Mello era onde antes fora a Fábrica d'El Rei

Na Ribeira da Carpinteira da parte do Norte, está uma grande casa, a que chamam a Fábrica d'El-Rei, tanto por ser direito senhorio dela como porque o enfiteuta conserva nela três dornas de tingir azul de pastel, e nas caldeiras todas as mais cores de experiência à imitação das que vêm de fora. Toda a tinta neste sítio é a mais singular ou pelo beneficio das águas que correm mais limpas e claras, ou por mais, e mais rápidas ou por naquela se não cortam, nem se viciam os materiais precisos para a graça e segurança das cores; e esta me parece ser a mais certa; pois presenciei em uma ocasião o mandar o enfiteuta dela botar fora uma dorna de tinta pelo pastel lhe não sair bom, em que perdeu mais de 300$000 rs., só a fim de que na sua fábrica se não dêem cores falsificadas. Pouco mais superior há um pisão com duas perchas, em que trabalham efectivamente 5 oficiais; e uma tenda de tozar, e prensar, em que trabalham 4 oficiais; e por concorrerem a esta mais panos e baetas, actualmente trabalham 18 pessoas. Faz o enfiteuta de despesa em lenhas, cada um ano, mais de 500$000 rs.
O enfiteuta, que actualmente existe, sendo a primeira vida, é Jorge Frois Nunes, homem muito prudente, de singular génio, de muita verdade e cons­ciência, muito amante do bem público; e por isso todas as manufacturas da sua fábrica são especiais, é obediente às leis de Sua Majestade, de sorte que sendo a fábrica toda sua, como pelo Regimento é proibido quem tem pisão, não ter tinte nem tenda nem prensa; tem este enfiteuta os tintes, e tem arrendado o pisão, tenda e prensa a pessoas separadas só por não encontrar coisa alguma contra o Regimento: quando outros fabricantes da mesma vila têm pisão, tinte, tendas e prensas; e o mais é que também são fabricantes de panos; e nestes é que se experimentam as maiores falsidades e roubos nos mesmos panos porque tudo fazem a seu arbítrio, o que não sucederia se cada um se conservasse com uma só ocupação.
As pessoas que se entretêm no trato, e contrato dos panos, se não pode ao certo numerar, porque são poucas as casas dos nacionais, em que não hajam obradores de lã; uns com cabedais próprios; e outros sem eles; e por milagre conservam oficiais; e finalmente, outros sendo pobres, também fazem seus panos, por acharem a lã barateada pela mão daqueles, a quem nada custou: há outros que hoje mostram refinado ódio aos que se ocupam e trabalham nas lãs, sendo estas o primeiro alicerce das suas casas, aqueles que em outros tempos lhes deram os nomes de grandes, os quais hoje não querem lhes passem pela memória, é por esta falta de conhecimento próprio, se diz, que se os filhos de Adão pecaram, os da Covilhã todos cardaram.

Ultimamente, os oficiais de cardadores que há nesta vila, uns que trabalham nas casas alheias e outros nas suas próprias, haverá 400; e igual ou maior número de fiadeiras à roda; setenta e dois teares de tecer panos e baetas desochenos porque dentro dela poucos se ocupam nos catorzenos, os quais todos de ordinário se fabricam pelos lugares mais próximos a ela, aonde há igual número de teares; e fora destes se tecem e fabricam nas vilas de Manteigas, distante pela Serra três léguas, e de Belmonte, na mesma distância para o campo.
(Continua)


Estatística baseada na lista dos sentenciados na Inquisição publicada neste blogue:

Publicações neste blogue sobre os monografistas covilhanenses:
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2015/01/covilha-memoralistas-ou-monografistas.html
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2014/12/covilha-memoralistas-ou-monografistas.html
http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2014/11/covilha-memoralistas-ou-monografistas.html
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http://covilhasubsidiosparasuahistoria.blogspot.pt/2014/08/covilha-memoralistas-ou-monografistas-x.html
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sábado, 7 de março de 2015

Covilhã - Os Ventos do Liberalismo/Os Ventos do Miguelismo VI


O século XIX é um período de grandes transformações políticas, económicas e sociais. As ideias liberais fervilham por todo o mundo, opondo-se ao absolutismo vigente.
 Encontrámos no espólio e nas publicações de Luiz Fernando Carvalho Dias alguns documentos que nos elucidam que na Covilhã também se viveram momentos revolucionários e contra-revolucionários. Houve muito descontentamento, reuniões secretas da maçonaria ou doutras associações (“sociedades denominadas patrioticas”), prisões, exílios, mortes, quer de miguelistas, quer de liberais constitucionalistas ou cartistas. Que miguelistas? Que liberais?

Os documentos que estamos a apresentar sobre a Covilhã acompanham a guerra civil que os portugueses viveram ao longo de várias décadas do século XIX: a Vilafrancada miguelista em Maio de 1823; a Abrilada em Abril de 1824, cuja derrota obriga D. Miguel a abandonar o país; a morte do rei D. João VI em Março de 1826 e o início da Regência da Infanta Isabel Maria; a Carta Constitucional outorgada por D. Pedro que se encontrava no Brasil, o 1º Imperador; a abdicação de D. Pedro em sua filha, Dona Maria da Glória, como Dona Maria II; o regresso de D. Miguel em 1828 e o país virado do avesso.
 Todas estas divergências e dúvidas parecem ficar esclarecidas quando D. Miguel, ao regressar de Viena em 1828, é aclamado Rei absoluto. Contudo há focos de oposição por todo o país, desde a Covilhã, passando por Aveiro, Faro, Porto e Coimbra. Aqui aconteceu um facto insólito e triste, quando uma comitiva foi a Lisboa em nome da Universidade saudar o rei D. Miguel e foi apanhada perto de Condeixa por um grupo de estudantes, os Divodignos, pertencentes a uma sociedade secreta de cariz liberal. Mataram e feriram a tiro aqueles miguelistas. O governo miguelista vai ser fortemente repressivo e persecutório, originando julgamentos, mortes e muita emigração de liberais para Inglaterra e Açores. Será pertinente fazermos referência ao que podemos chamar miguelismo, uma espécie de sebastianismo negro?
Oliveira Martins apresenta números da repressão miguelista: nas prisões 26270; deportados para África 1600; execuções 37; julgamentos por contumácia 5000; emigrados 13700. Segundo Vítor Sá foi considerada culpada à roda de 15% da população. Há ainda outros números: cerca de 80000 famílias, cujos bens foram confiscados.
A oposição liberal manifesta-se e centra-se no Porto, desde que D. Miguel é aclamado rei absoluto. Os absolutistas liquidam estes revoltosos que, no entanto, se vão conservar vivos, mas longe, no estrangeiro europeu e na Ilha Terceira (Açores). Para defender o trono de sua filha Dona Maria, vem ter com eles D. Pedro, o IV e o 1º Imperador do Brasil. Para combater os 80000 soldados miguelistas, consegue juntar mais de 7000 soldados que irão encontrar-se várias vezes numa triste guerra civil entre 1832 e 1834 que só termina com a Convenção de Évora Monte (1834). Enquanto uns combatem outros legislam: Mouzinho da Silveira lidera o primeiro Ministério liberal promulgando reformas económicas, sociais, fiscais, administrativas e judiciais.
1834 é o ano da derrota miguelista e do início da governação de D. Maria II, embora a estabilidade ainda esteja longe…  Agora as guerras vão ser entre liberais.
    Como vai a Covilhã celebrar a vitória Liberal/derrota miguelista? "...soaram na praça desta vila os vivas a nossa legitima Soberana a Senhora D. Maria II, a Vossa Magestade Imperial, e a todos os outros objectos tão caros aos verdadeiros portugueses..." (Abril de 1834)

Dona Maria II
D. Pedro IV




“Senhor = Possuidor do mais vivo entusiasmo temos a honra de levar respeitosamente ao conhecimento de Vossa mag.e Imperial os felises e gloriosos sucessos ocorridos nesta vila a pró da Legitimidade em cuja defeza V. Mag.e Imperial tão honrosa e decididamente se acha empenhado.
            Constando na manhã do dia 22 que os habitantes da Guarda tinham aclamado o legítimo governo de S. Mag. Imp.ªl o Regedor das Justiças com alguns membros da Alçada, e outros desembargadores e magistrados que ocupavam a Vila, imediatamente se retiraram, apoderando-se então o terror das autoridades, e de todos os inimigos da Legitimidade, estes seguidamente ou se evadiram ou se esconderam.
            Um desalento tão pronunciado despertou nos corações dos liberaes a heróica resolução de despedaçar as algemas com que tão cruel e injustamente os haviam agrilhoado, esqueceram-se os perigos, correu-se um véu sobre o futuro (sic), e forçando-se as portas das masmorras, aonde jaziam as desgraçadas vítimas da tirania, soaram na praça desta vila os vivas a nossa legitima Soberana a Senhora D. Maria II, a Vossa Magestade Imperial, e a todos os outros objectos tão caros aos verdadeiros portugueses.
            Mas a falta de meios para manter uma resolução tão pronta e energicamente executada, o ponto crítico em que nos achavamos colocados; por toda a parte ainda rodeado de povoações que ainda tinham a voz do usurpador, por algumas horas entibiou os menos fortes; todavia não era este o momento para reflexões; o zelo pela causa da legitimidade bem depressa desvaneceu as nuvens do receio de sorte que às sete horas da tarde já se tinha feito a aclamação por todas as ruas desta Vila, recolhendo todos aos paços do concelho da mesma aonde se procedeu à nomeação duma junta provisoria, de que temos a honra de ser membros. Aceitando a lisongeira comissão de que haviamos sido encarregados, não nos poupamos a fadigas para fazer vingar a justa causa que defendemos. estabeleceram-se patrulhas de voluntários a pé e a cavalo, expediram-se ofícios para todos os povos e cidadãos mais acreditados, e não se omitiu providencia alguma das que podiam aproveitar em crise tão melindrosa e arriscada. Ainda que no dia 23 se tinha reunido já grande número de patriotas armados, ardendo em desejos de se bater com os inimigos de V. Mag.e Imperial, contudo este recurso não era ainda de seguridade, atendendo a que estavamos inteiramente isolados, foi por isso que recorremos ao general espanhol, comandante da força armada estacionada na cidade da Guarda, o qual prontamente fez marchar uma força respeitavel sobre esta Vila. É inexplicável o entusiasmo que desenvolveram os inimigos da legitimidade com a vinda desta brilhante tropa, assim como não pode exceder-se o acolhimento e os bons oficios que à porfia lhe temos prestado, de que eles se fazem credores pelo seu brioso comportamento.
            Não nos limitámos Augusto Senhor, a restaurar nesta Vila e em todos os povos do seu termo o legitimo governo da Augusta Filha de V. Mag.e Imp.ªl mas cooperámos para que se fizesse o mesmo na Vila do Fundão, que desgraçadamente não poude manter-se por lhe aparecer pouco depois o rebelde Nicolau d’Abreu, intitulado general desta Província, que com alguns aventureiros pretende ainda prolongar a escravidão em que temos vivido, estão porem tomadas as medidas para irmos prontamente socorrer aquela infeliz vila, animados pela justiça da nossa causa esperamos em breve ver ali restabelecido o paternal governo de V. Mag.e Imperial.
            No meio de todas estas oscilações políticas temos tido a satisfação de ver por toda a parte a harmonia e a ordem; e bem longe de se pisar a estrada desse governo desorganizador e despótico, tem sido respeitadas as propriedades, afiançada a segurança de todos os cidadãos, e os dias da restauração têm sido como dias de festa anunciadores de um futuro mais risonho e brilhante.
            Oxalá que estes nossos serviços feitos à causa da legitimidade se façam credores da Real Aprovação de V. Mag.e Imp.ªl e da nossa Augusta Soberana cujos dias céu dilate e prospere para ventura de todos os patriotas portugueses. Covilhã, nos paços do Concelho aos vinte e oito de Abril de 1834 = O Presidente Antonio Gabriel Pessoa d’ Amorim = O Vogal Pedro Vaz de Carvalho = O Vogal Joaquim Antonio Clementino Maciel = O vogal Sebastião de Elvas Leitão Montaes = O Vogal Daniel José da Silva Campos Melo = O Vogal José Caldeira Pinto Castello Branco = O Vogal Bernardo de Almeida Lemos=.

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Sexta feira 16 de Maio
Secretaria de estado dos Negocios da Guerra. 1ª Rep.ção. 1ª secção

“Tendo o Marechal do Exercito Duque da Terceira remetido pela Secretaria de Estado dos Negocios da Guerra uma felicitação que a Comissão Municipal da Vila da Covilhã dirigiu a S. Mag.e Imp.ªl o Duque de Bragança, Regente em nome da Rainha, narrando os gloriosos acontecimentos que ali tiveram lugar no dia 22 de Abril ultimo, por ocasião de se aclamar expontaneamente, e com o mais vivo entusiasmo o legitimo governo da Rainha, e da Carta. manda o mesmo Augusto Senhor declarar à mencionada comissão, que lhe foi muito grato o brioso comportamento do povo daquela vila, digno de todo o louvor tanto pelo expontaneo desenvolvimento a pró da causa da justiça e da Honra, como pela maneira generosa com que se tem conduzido na conservação da ordem, e segurança da propriedade de seus concidadãos. Sua Mag.e Imp.ªl está certo que só o jugo duma tirania tão atroz como a do usurpador podia sufocar os nobres sentimentos da Nação Portuguesa, e por isso espera que todos horrorisados do tempo pretérito trabalharão em arreigar o sistema constitucional de que essencialmente depende a prosperidade da Pátria.
Paço do Ramalhão, em 14 de Maio de 1834 = Agostinho José Freire.

Fonte - Cronica (Constitucional) de Lisboa 
fls 453, fls 469, respectivamente

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