quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Covilhã - As Sisas I


     Vamos iniciar hoje a publicação do tema - As Sisas - pois encontrámos alguns documentos sobre o assunto no espólio de Luiz Fernando Carvalho Dias.
     As sisas são um imposto indirecto que incidia sobre contratos de compra e venda ou troca. Era um imposto municipal temporário e existia pelo menos desde o século XIV, mas, por exemplo, D. Fernando aproveitou-se várias vezes dele, tornando-o um tributo régio o que levava o povo a apresentar em Cortes queixas contra o Rei.

     Fernão Lopes, na “Crónica de D. João I” diz-nos: “ E vemdo os Reis taees remdas de sissas, avemdo vomtade de as aver mostravã ao povo necesidades pasadas ou que eram por vir e pedimdolhas graciosamête por dous ou tres annos que loguo as leixariam e outorgando as desta guisa em adiã depois outras necesidades pera que as aviam mester e pediam nas por mais tempo; e asy lhe ficou a pose dellas, mas nã que elles as deitase”

     É D. João I que nas Cortes de Coimbra de 1387 lança o imposto denominado Sisas Gerais, incidindo sobre tudo e todos e passando a permanente.
     Ao povo foi difícil aceitar esta mudança de imposto municipal, utilizado para aplicar em despesas extraordinárias do concelho, a imposto da Coroa usado não só para a guerra e exército, como noutras despesas do Estado. Os reis não vão abdicar dele, tanto mais que significava quase três quartos das rendas da Coroa.
     A permanência do tributo levou a que fossem nomeados muitos oficiais, publicada legislação e orientações no sector da Fazenda. Em 1520 já os rendeiros das rendas ou siseiros estão obrigados a usar o novo regulamento das sisas. Estas vão sendo sempre um problema grave, quer para a Coroa que tinha dificuldade em arrecadar o imposto, quer para as populações que estavam cada vez mais contrariadas com o seu crescimento, sentindo-se pressionadas pelos rendeiros; por isso pretendem deixar de o pagar, como se pode constatar nas cortes de Torres Novas, 1525. Tal não lhes vai ser permitido, mas apenas o estabelecerem contratos de sisas com o rei D. João III através dos seus procuradores, onde se fixam quantitativos inalteráveis. A Covilhã faz o contrato das sisas em 1528, a par de outras povoações.
     Primeiramente são nomeados e escolhidos os procuradores régios e os procuradores dos concelhos, depois preparado o Regimento e só em seguida negociados e assinados os contratos das sisas.
     Foram assinados mais de duzentos contratos que se encontravam na Torre do Tombo e dos quais D. Maria I (1789) mandou fazer uma cópia.
     Antes do Contrato da Covilhã, que é bastante extenso, apresentamos um índice dos contratos e o Regimento usado para a resolução deste assunto.
 

ANTT - Contratos D. João III
Índice 


Alcongosta – Lº 2, f 77 vº; Lº 6, f 86

Alcaria – Lº 6, f 73, 86

Belmonte – Lº 7, f 120

Castelo Novo – Lº 3, f 26

Covilhã – Lº 2, f 77; Lº 6, f 86

Valhelhas – Lº 2, f 17

Cêa – Lº 1, f 94 vº, Lº 6, f 62 vº

Manteigas – não vem

Castelo Branco – não vem

S. Vicente da Beira – Lº 4, f 98; Lº 5, f 37

Penamacor – Lº 7, f 112 vº

Pena Garcia – Lº 2, f 125 vº; f 127; Lº 6, f 46

Guarda – Lº 2, f 93; Lº 7, f 3

Idanha-a-Nova – Lº 1, f 41; Lº 7, f 35

Idanha-a-Velha – Lº 2, f 11 vº

Sovereira Formosa – Lº 2, f 120

Sortelha – Lº 1, f 91 vº; Lº 6, f 55 vº

Rosmaninhal – Lº 2, f 26 vº

Sabugal – Lº 2, f 45; Lº 8, 195 vº

Proença-a-Nova – Lº 4, f 59 vº

Monsanto – Lº 2, f 124 vº; Lº 6, f 43 vº 

Hoje encontramos estes contratos no ANTT com o código de referência: PT-TT-COP

A Moeda (iluminura do Livro de Horas de D. Manuel)
 
Regimento que levou Christovão Mendes quando foi tratar do negocio das sisas na Provincia de Tras os Montes 

Treslado do Regimento do Licenciado Christovam Mendes 

A maneira que vós Licenciado Christovão Mendes do meu Desembargo avês de ter no dar das sisas aos concelhos da Comarqua da Beira, Trallos Montes, e Antre – Douro e Minho he a seguinte:
Item. Primeiramente hyrês à Comarqua de Trallos Montes àquelles lugares que vos milhor parecer e ouuerdes por enformação que requerem, lhe dem as sisas, ou que vos parecer que com milhor vontade as querem tomar, e farês juntar em camara os juizes, vreadores, Procurador do Concelho, aos quaes notificareis o poder que levaees, e allem dello lhe dirês da minha parte, que nas Cortes, que ho anno passado fiz em Torres–Novas me foy requerido por alguus dos Procuradores das Cidades, Villas, e Lugares de meus Reynos, que pelos tirar de grande dano, em que poderião encorrer, leixando ir as sjssas no crecymento, em que vaão, que lhes a elles seria mui grave de sofrer, segundo se tem visto por expryencya pelo crecimento dos annos passados, me pedião por mercê que quisesse a ello prover, e dar remedio como se atalhasse o que se poderia fazer, querendo eu tomar delles renda certa, e sabido em lugar das ditas sysas, e lhas alargar, pera que as mais nom ouuesse, somente a dita renda certa, que antre sy repartissem, segundo cada hum a merecesse, e que por aqui se tolheriam os agravos, e opressões que recebem dos oficyaes, e Rendeitos na recadação dellas, e que eu desejando de lhes fazer mercê, e dar toda boa ordem, e maneira como se fossem fora dos ditos enconvynientes, vos mando a elles para juntamente praticardes, e concertades a maneira que milhor seja, porque a mim me praz lhes leixar as ditas sysas, por renda certa, e sabida, que em lugar dellas me dem o que vós lhe direis, e representarês pelas milhores pallavras que vos parecer, porque lhe notificarês a tenção que tenho pera lhe fazer mercê, e os rellevar dos ditos agravos, e opressões, que dizem que recebem, e vós trabalharês quanto em vós fôr de no dito caso tomar assento.
E se entenderdes que pelos da Camara, e os que tem mais poder no povo, que até gora pagarem menos siza aos Rendeiros, ou nom pagarem nehuas se fez contradição ao assento, e concerto da dita siza, chamarês os do povo todos por codrilhas, ou vintenas, ou Fregesyas, como vos parecer que milhor se pode fazer, aos quais tomai as vozes, e parecer no dito caso, de maneira que todos sejam perguntados com hu Escripvão, que pera ysso tomarês, e escrepvei seus ditos, e assinados, e achando por mais vozes, que querem o dito concêrto, e que ho ham por proveitoso ao povo, o farês, e assentarês segundo o levais por este Regjmento.
Item No dito chamamento das Camaras mandarês que nom entrem, nem dem voz nenhuu oficyal das sizas, porque nesta caso, os ey por sospeitos ao povo, antes se souberdes que alguu delleos de noite, ou de dia anda pelas casas, ou em outra maneira provocando, ou endozendo os que ham de dar voz no dito caso, ou fazendo por seus parentes, amigos, e criados, em modo que saibaes, que dello procede, em tal caso os prenderês, e farês auto de culpa que lhe achardes, e mo farês saber pera nisso prover como seja justiça e meu serviço, e a mesma maneira terês com qualquer outra pessoa que achardes que escondidamente andam endozindo, e provocando as pessoas, que nisso ham de dar voz, por quanto pois estes taees tem lugar pera em Camara, e em seus Conselhos, e ajuntamentos dizerem o que lhe parecer livremente por bem seu, e da repruvica, nom se presume, que o quererão fazer quando escondydamente, e em lugares apartados buscarem modo pera provocar outros.
Item. O concêrto que com os ditos Lugares avês de fazer seja dar-lhes as ditas sysas por outra tanta renda sabyda na contia, em que agora as ditas rendas estam arrendadas, com condição que farão os pagamentos conformes aos apontamentos que levaees.
Item. Porque as rendas dalguus logares estam muyto baixas, e de quebrado, a estes nõ yrês, porem se por sua parte vos for requerido que lhes dês as ditas sysas poendo-se ellees em preço onesto, e rezoado, mo farês saber, pera nisso mandar o que for meu serviço, e bem do povo, e vos terês lembrança de me mandardes enformação de todo muy decraradamente, a saber, o prêço em que ora estam os taes lugares, e o porque esteverão os annos passados, e o que mais querem dar, e o que nisso vos parecer. e porque tambem som enformado que alguus lugares estam muyto altos, e em mayores preços do que soya ser, a estes dyrês, que por lhes fazer mercê me praz lhes dar as ditas sysas pera sempre por menos até a decyma parte, do que agora estam; e porem isto da decyma parte lhe nom decrararês loguo, se nom quando virdes que he necessario; e se em outra maneira se nom poder concrodyr (sic), mo far~es primeiro saber, pera averdes minha resposta.
E no dar das ditas rendas pelo que agora estam, menos a decyma parte, pela maneira sobredita averês respeito à rematação do Almoxarifado, e as darês segundo couberem em verdadeira repartição, e se achardes que as ditas rendas demenuirem por engano, pelos Rendeiros princypaees as quererem tomar pera sy, ou por culpa, ou negrigencya de meus oficyaees, averês respeito a isso, e as nam darês com a demenuyção, que enganosamente se fez, mas como verdadeiramente poderião e deverião caber em repartição segundo a rematação do dito Almoxarifado, e assy mesmo farês achando que sobyrão enganosamente por dadivas dos Rendeiros, ou alguus outros enganos.
Item. Levarês de minha Fazenda o Caderno das rendas, em que ora estam arrematados os Almoxarifados onde hyes, pera por ellees tomardes enformação da contia, porque estam arrematados, o qual caderno concertarês com os Livros dos Contos, e qualquer deferença que nisso achardes, mo farês saber.
E por quanto do anno de quinhentos e dezanove annos pera caa, som feitos novamente muytos oficyaes em lugares, em que os nom soya aver; Eu ey por bem q esses taes nom os haja mais, e esses sejam extintos, e desfeitos sem Eu, nem os ditos Concelhos lhe avermos de pagar mantimentos alguus, salvo sendo necessarios, q os mesmos hos ajam de usar nos ditos Lugares d’alguns dos ditos oficyos, porque daquellees oficyaees desses oficyos de que os ditos povos ouverem de usar, ficarão oficyaesaquellees, que ora som, e tem suas Cartas.
E quanto aos outros oficyaes, que som feitos anteez do anno de dezanove, pagarão os Concelhos seus ordenados, e achando-se por direito que Eu som obrigado ha compoer, e a stisfazer aos oficyaes seus oficyos, ou outra cousa algua, os ditos concelhos serão hobrigados ao pagar em sua vyda delles, e fallecendo os oficyaes, que a satisfação ouverem, ou vagando os ditos oficyos por qualquer maneira que seja, não avera hi mais os ditos oficyaes, nem Eu, nem meus oficyaes proveremos mais dellees, e se hacontecer de os darem contra forma do contrato, a provisão sera nehua, e os concelhos ficarão livres de averem de pagar mais os ditos oficyaes, e ganharão, e averão pera sy o que ellees soyão d’aver, salvo aquellees oficyaees, q pera arrecadação dos dinheiros de minhas rendas forem necessarios, porq a estes pagarão os ditos concelhos seus ordenados.
Item. Levarão convosquo hu boõ Tabelião, que em huu livro faça as notas destes Contrautos, e assy tambem faça outro livro, em que escrepva, e tyre da nota todos os for pruvico, ey por bem que no que tocar a estes Contrautos possa fazer pruvico, e o synal que assy ouver de fazer, ficará feito no Livro da Chancelaria dessa Comarqua.
E nos Lugares, em q concertarem de tomarem a dita sysa farês o Contrauto, segundo a nota q delle levaes, e sempre me avysarês do q dos pânos nunca, fazeis em cada huu lugar, e de qualquer novidade, q sobre vyer, ou d’outra cousa, que vos parecer, q compre a meu serviço, e todo vos encomendo, e mando, q façaees com muyta delligencya, e boõ recado como o de vós confio, e como sempre fezeste as cousas de meu Serviço, de que fostes encarregado. Escripto em Beja vinte dias de Setembro Bastião da Costa o fez de mil quinhentos e vinte seis. (1)
 

Bibliografia – 1) ANTT - Livro 6 das Gavetas, fls 13 a 15vº (?)
Cruz, Maria Leonor Garcia da – “A Governação de D. João III: a Fazenda Real e os seus Vedores”, Centro de História da Universidade de Lisboa.
“Dicionário de História de Portugal” – Dirigido por Joel Serrão, Iniciativas Editoriais.

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